07 setembro 2011

























Steve Remigio Delgado
non nova sed nove, abril 2011

03 setembro 2011


WHITE NIGHT  (TEL AVIV)

                                                     
Para o John O`Toole

A céu aberto, ceiam.
Celebram pactos  e assinalam lutos
com cal negra.  Inocentes,
Tão inocentes quanto o infinito.
Ainda que sentados, podemos
Adivinhar-lhes as asas. Assim
Como medir-lhes o grau de pureza
Nas canecas de azeite etílico.
Eis os anjos de Tel Aviv,
Envoltos nas trevas transparentes da cidade. 





Vitor Vicente
non nova sed nove, abril 2011

31 agosto 2011



A PINT OF PAIN            

                Para o m. parissy

Amarga como chocolate noir,
imprópria para descardíacos
e  para aqueles que descrêem
na redenção da realidade
através de uma dose de romantismo.
Servem-na com uma espécie de tapete
que pode ser e não ser suporte,
para ver quem cai primeiro
aos pés da pain,
a pint ou o prisioneiro de si próprio?





Vitor Vicente
non nova sed nove, abril 2011

28 agosto 2011



















Alexandra Demenkova
non nova sed nove, abril 2011

27 agosto 2011


Que sonhem...

Ah, os revolucionários...
Belos sonhos de aliviar os sofrimentos
das classes exploradas...
Que sonhem a liberdade,
que nos libertem dessa vida aborrecida...
Deixemos que sonhem
e que façam da lágrima o sorriso,
que tragam de volta a graça de Ser...
Que trabalhem humanisticamente
Que façam a (verdadeira) política cidadã.
 
 
Wellitania Oliveira
non nova sed nove, abril 2011

26 agosto 2011


Jazido do poder

Aves de rapina,
saqueadores de sonhos,
forasteiros de nenhum lugar...
Fantasmas vivos na noite,
na trama dos golpes, das injustiças...
Indiferentes aos sonhos dos pequeninos
do jovem, do adulto e do idoso...
Roubam a consciência dos homens
a beleza das rosas que desabrocham
o brilho do sol, se é dia
o brilho da lua, se é noite
e voam mais alto... mais alto...
e do alto cospem o veneno da morte
e descem a sepultura como seres bestiais.
E transformam-se em fantasmas
perdidos nas sombras da noite.
Assim jaz, o poder que subordina toda gente!


Wellitania Oliveira
non nova sed nove, abril 2011


24 agosto 2011


Skiá

Narciso, saber-me Eco.
Compaixão: sentido reflexo,

narcótico e curvilígneo,
abismo, chão, sozinho.

Beber dos olhos
a água cristalina...
Turvar das águas
minhas mãos-rotina...

Nascer das águas,
eu sempre nasci.

Morrer de águas,
eu sempre morri.

O olhar, nem fundo nem raso,
no rosto que tem prazo.

Dotar de asas um anjo,
deitar trincado um boneco.

Buscar toda vida Narciso,
sobrar toda lida Eco.


José Carlos Freitas
non nova sed nove, abril 2011

22 agosto 2011


Senha

Chove... as músicas, no rádio, bregas...
choro fácil de matutina ordenha.
Choro o que é para ser dançado,
destino de esquecida senha.

Examino as minhas paredes,
nem é solidão o que me deplora.
Teço fomes de minhas sedes
e o que me dança sempre chora...


José Carlos Freitas
non nova sed nove, abril 2011


19 agosto 2011


Passeio

Uma casa verde ladeada doutra vermelha.
Uma outra azul, mais outra amarela.
A rua sobe, torneia.
Nos jardins, rosas são cor-de-rosa
e violetas são violetas.
A vida é colorida; meus olhos, não.
Pessoas caminham; algumas delas, felizes.
Perseguem projetos futuros; eu, cicatrizes
que repasso de olhos no chão.
Num simples muro de um baldio terreno
folhas e flores, várias matizes.
O jambeiro tem aos pés tapete lilás.
E as pernas insistem tocar adiante
quem  busca cicatrizes
em cicatrizes que ficaram atrás.


José Carlos Freitas
non nova sed nove, abril 2011

17 agosto 2011


Frankfurtiana

Primeiro, benjamin!
Benjamin mucho, benjamin mucho más.
Depois, horkheimer...
alkzeimer... alkzeimer,
marque e use, marcuse, marcuse...
E então Ernst: bloch... bloch... bloch...
bloch... bloch... bloch... bloch... bloch...

Teorias, estéticas...
análise do discurso de teu corpo,
semiótica de tua pele...

Buceta cubista,
pinto surreal:
ambos expressionistas.

No fim: te adorno,
Theo, dor.


José Carlos Freitas
non nova sed nove, abril 2011

16 agosto 2011


PEQUENAS SETAS QUE AFASTAM OS OLHOS

1.
A manhã começa com o vento varrendo o pó da rua
e na varanda arrastam-se cadeiras algumas vozes determinam
as horas ou mesmo até a temperatura -- o dia vai ser tórrido
fragilizando mesmo o que resta ainda da nobreza dos cactos.
Revejo o mapa e tento localizar entre os rios e os longos carris
dos comboios o lugar. Entretanto outras vozes
adivinham não só o presente mas ainda o que o futuro será
se as marés derrubarem a escarpa frágil
e bela como um castelo rendilhado -- gosto da sua côr
adoçando o sol sobre o azul do mar -- na curva distante
entre rudes sombras as folhas agitam o caminham íngreme
é uma aragem brusca que faz rodopiar os cabelos e abrandar os passos.
Nesse lugar nada muda nem o tempo
e na realidade o que se observa é um inventário
de espantosas mudanças subtis. O que atrai o meu olhar
como um feixe de luz ou lâmina mistura territórios íntimos com paisagem
e mistério. A botânica é uma ciência de lucidez que conduz o tempo
e o conhecimento um vínculo de aparências e eu
recordo apenas com nitidez o nome
dela na camisa transparente.


2.
O mar ali ao longe desenha o que observo
aqui sentado uma imensidão insondável
e uma perda que os meus olhos
contemplam -- o mundo fica desfocado
e cresce impossível na duração do tempo
enquanto os barcos rumam na distância
exacta da minha miopia numa forma
insistente que atravessa os séculos
e nomeámos para chegar adivinhando
o que o desejo sulca e mistura
na boca como um rasgão -- as cores minuciosas
do lençol feroz das águas.


3.
As gaivotas adejam o branco alvo das suas asas na cal branca da casa.
As andorinhas abandonaram os ninhos insuspeitos. As árvores são tristes
no seu interminável esquecimento. Os muros queimam as sombras
vagarosamente. As flores silenciosas na sua plenitude absoluta
invadem o meu olhar. É frágil a turvação melancólica do céu.
Pequenos detalhes frívolos ameaçam este lugar moribundo.
Uma navalha infatigável rasga-me a memória e os dentes.
O estertor de um rio estilhaça a agonia do verão. Uma labareda
resiste nos meus dedos medindo o destino. Ou a tenaz vontade
de enganar a paisagem.


Jorge Velhote
non nova sed nove, abril 2011


15 agosto 2011



Plenitude

Feito chuva de primeira vez,
Meu coração será regato claro,
No nício das águas.

Só terei perfume de jasmins,
Asas de borboletas amarelas,
Vôos de colibris
E teus olhos, mel de jatis,
Que buscassem no favo de minha boca
A ardente pétala sonífera

Com que tombassem, tontos de orgasmo.




Fabiano Donato Leite
non nova sed nove, abril 2011

13 agosto 2011



Lâmina afiada

Teus medos,
Fantasmas mendigos
Rondando a porta,
Fazendo-te de pão.

O ontem,
A aventura desregrada,
A peregrina saga
Em busca da luz.

O agora,
Risível pantomima,
Partidas asas
Num ninho de torpor.

E ainda,
As sombras em ronda
Até que te açoite
A realidade da noite...

....................................

E sua fatídica verdade.





Fabiano Donato Leite
non nova sed nove, abril 2011



12 agosto 2011



De mãos Sujas

Permaneço
No banquete dos anjos,
De mãos sujas...

Mas quem poderá dizer
Se as sujei de vícios
Ou de servidão...?

Permaneço
Emudecido na sarjeta
Com anjos sujos

E quando breve
Muito, muito breve
Verei a ressurreição...

Que a luz do banquete
É toda minha.
Tomaram-na de empréstimo.

Aqui, comigo o coração se aquieta,
Enquanto tua alma,
Afinal se desespera!





Fabiano Donato Leite
non nova sed nove, abril 2011



11 agosto 2011


POEMA

Ao fundo, as nuvens chocam com as
casas. Os pássaros gritam e há homens
que se atiram das varandas como se
fossem vasos empurrados pelo vento.
Os carros esmagam os bichos que correm
pelo alcatrão. É quase Primavera, o frio
anuncia uma culpa antiga, a solidão
dos guerreiros. E há um outro homem
que diz: gosto das árvores, do seu tronco
e das raízes que rasgam as calçadas. Esse
homem decidira viver porque pertencia
à humidade das paredes, aos telhados de
barro, às bétulas. Era dali que lhe vinha
a força dos braços, a claridade que se lhe
prendera à pele. Era esta a sua confissão.
Mas, após ter dito aquelas palavras lançou-se
para o espaço, seguindo a trajectória da chuva.



Jaime Rocha
non nova sed nove, abril 2011

10 agosto 2011

















Alexandra Demenkova
non nova sed nove, abril 2011

09 agosto 2011



Sim, a segurança,
A rede lá em baixo
A mostrar que é possível
Não cair.

**

Não, mais perto do vazio
Seria impossível.
Cada um se senta onde calha
E a atenção varia.

**

Sim, os pés ficaram molhados
Dentro dos sapatos
Porque a chuva se acumula
Nos buracos abertos
Pela nossa falta de vontade de crescer.

**

Não, nada de esperança.
O destino está nos debates sobre a segurança social
Que permitem que nos preocupemos
E choremos por antecipação
A morte preparada para cada um.

**

Sim, tinha os olhos grandes e fumava
Com a delicadeza própria de quem
Conhece os malefícios de o fazer.
Deixava-se olhar
Com o cigarro preso entre os dois dedos
E entre os dois lábios.

Olhava também
Para confirmar que nem tudo
Depende apenas do movimento.

**

Não, nunca mais seremos
Vigilantes.
As nossas posses extinguem-se
No momento em que negamos
O que não nos queima.

**

Sim, as vítimas da fome
E de calamidades vistosas,
Os quase mil ou quase vinte mil
Ou outro quase número
De famélicos ou desalojados,
Contabilizados pelo repórter no local,
Em directo,
Prontos a marchar sobre a consciência,
Sensibilizada,
Até ao próximo bloco de anúncios.

**

Não, nada disso,
Outra coisa para lá do óbvio
Que cada desilusão é.


Rui Almeida
non nova sed nove, abril 2011


08 agosto 2011



PROCESSO ELEITORAL: O DISCURSO DO VENCEDOR


«falo para todos os portugueses, aqueles
que têm as televisões ligadas neste canal,
aqueles que são audiência de outros
canais e aqueles portugueses que têm
a televisão desligada – por desleixo ou
ignorância. foi um caminho
difícil. tentei estar perto da vossa
alma, mesmo sabendo que as séries,
os reclames a refrigerantes
a roupa ou a electrodomésticos
capturaram o pouco de atenção
de que ainda são capazes. lutei
contra o botão off dos vossos
telecomandos. sei que posso
imediatamente desaparecer das vossas
casas se desligarem os ecrãs, como
alguns de vós ainda insistem em fazer.
os dois votos que obtive foram muito
importantes. agradeço publicamente
a essa pessoa, à sua atitude cívica,
ao seu sentido de responsabilidade,
ao modo como me lava e passa
a roupa sem queixume. especialmente
para ela envio o meu obrigado.
prometo agora reflectir,
desaparecer durante quatro anos,
fazer riscar a palavra mudança
de todos os dicionários».

Rui Tinoco
non nova sed nove, abril 2011

07 agosto 2011

O PROCESSO ELEITORAL: O DISCURSO DO VENCIDO


«do universo de pessoas que votaram
em mim, obtive uma cobertura
de cem por cento», defende o Vencido,
«eis um facto incontornável que todos
os meus adversários pretenderam minimizar.
olho-vos nos olhos: estou certo
que a dinâmica gerada pela campanha,
pelas pessoas que fui encontrando
na rua, pelas opiniões que fui ouvindo
vai ser imparável, é já imparável.
dou desde já os meus parabéns ao
Vencedor: ele soube como nenhum
outro ludibriar as audiências,
parecer na televisão tudo aquilo
que não é. é necessário por isso conceder-lhe
valor e é por esse motivo
que lhe tiro o chapéu, apesar
de tal gesto tornar menos atractiva
a minha imagem. pelo menos
foi nesse sentido que me advertiu
o responsável de campanha.
falo-vos de coração aberto
e lembrem-se: cem por cento
dos que votaram em mim
concordam com as minhas ideias.
cem por cento dos que votaram em
mim fizeram uma cruz a seguir
ao meu nome. cem por cento
dos que votaram em mim votaram
em mim. lembrem-se: cem
por cento». convém ainda observar,
acrescenta o Locutor, sim esse mesmo,
que o candidato obteve um voto
no escrutínio que termina justamente
neste momento.

Rui Tinoco
non nova sed nove, abril 2011

02 agosto 2011

















Alexandra Demenkova
non nova sed nove, abril 2011