06 julho 2010

Rua Lisboa

Estavam dois olhos tristes na multidão
tantos olhos curiosos sem ser
um, ou outro,
sem perceber
que também deles era a morte
ou o caminho
que não podiam percorrer
nem o horizonte havia para compreender.

Havia um homem que não tinha poder
e ainda outro que o não queria
uns que viviam, outros que eram a vida
um corpo estirado no chão
que tão pouco se dava conta que existia.

Uma montra de vidro baço
e dejectos marginais
uma rua larga
que nada continha
para além das vontades procuradas.
Os cantores da rua, sós,
como só as pessoas não querem estar.

Uma chuva de imagens no fundo
duma infindável estrada de vontades
ou uma pele de homem
que cobre um futuro esquecido.

Aquele corpo hirto - nulo dizem uns -
de fora, aqueles que não têm tempo
sem saber
que o tempo existe ou não existe.
No caminhar fácil de estradas feitas
e no evitar constante
daqueles que procuram apaziguar a besta.

Nos corpos procuram a vida
que o viver lhes negou
nos remorsos que não têm
desfolheiam um momento
com medo do que perderam ontem.

Da janela por cima de Lisboa
transeuntes cobertos pelos edifícios, mas sentem-se.
Mil conclusões, algumas luzes
pensamentos vagos.
Uma vontade de criar palavras

por cima da cidade
ou talvez outra cidade.

Ricardo Bordalo
in non nova sed nove nº3, abril 92

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